Futebol é sinônimo de identidade. Coletividade. Representatividade. Futebol é um espaço onde os diferentes estão juntos por um amor maior. Inexplicável.
Permissão para uma pequena correção: a explicação acima é um retrato do que o futebol deveria ser, não o que ele é. Eis aqui o que o futebol é atualmente: um ambiente desanimador repleto de casos racistas entre diversos participantes do movimento.
Neste dia 21 de Março, Dia Internacional da Eliminação da Discriminação Racial, somos convidados a refletir não apenas sobre os avanços conquistados ao longo dos anos, mas também sobre os desafios que ainda estão presentes em nossa sociedade. Neste caso, é fundamental pensarmos sobre como o esporte, uma ferramenta de inclusão, ainda carrega tantas barreiras, seja nas arquibancadas ou em campo.
Apesar de ter acontecido casos anteriores, a pauta sobre racismo entrou para os holofotes do mundo futebolístico após publicações do jogador brasileiro Vinícius Jr., vítima de racismo no Campeonato Espanhol. “Não foi a primeira vez, nem a segunda, nem a terceira. O racismo é normal em La Liga”, declarou Vini Jr. em suas redes sociais, ainda afirmando que pediu aos órgãos superiores de futebol para lutarem contra todos os ataques sofridos durante os jogos, porém, na Espanha o racismo não é crime.
O fato de Vini Jr. não ter abaixado a cabeça para todas as situações que presenciou e todas as críticas que recebeu muito foi importante para que os casos, não apenas dele, mas de outros companheiros de profissão, tivessem visibilidade nas redes sociais e mostrassem para as entidades responsáveis que algo precisa ser feito a respeito.

Saindo do cenário europeu e chegando na América do Sul, é possível observar que as situações entre torcedores e jogadores sul-americanos e brasileiros não é diferente. Durante uma partida da Libertadores sub-20, Luighi, jogador do Palmeiras, foi vítima de racismo por um torcedor do Cerro Porteño, que fez gestos imitando um macaco e cuspiu no jogador durante a sua substituição.
Durante a entrevista pós-jogo, Luighi, muito abalado com o ocorrido, interrompe o entrevistador e toma a palavra para desabafar sobre o que aconteceu: “É sério isso? Você não vai perguntar sobre o ato de racismo que aconteceu comigo? É sério? Até quando nós vamos ar por isso? O que aconteceu comigo foi um crime. Você vai perguntar sobre o jogo mesmo? A CONMEBOL vai fazer o que sobre isso?”
A CONMEBOL emitiu uma nota afirmando que rejeita todo ato de racismo ou discriminação e que irá implementar medidas disciplinares apropriadas. O que seria mais uma nota de repúdio desses casos, se tornou uma piada sem graça, visto que alguns dias após o caso de Luighi, o próprio presidente da CONMEBOL entraria em uma polêmica sobre a pauta.
Na última segunda-feira (17), durante o sorteio da Copa Libertadores, Alejandro Domínguez, presidente da CONMEBOL, foi perguntado sobre a possibilidade de não ter clubes brasileiros participando da competição. Ao responder, ele afirma que não consegue imaginar esse cenário, pois “isso seria como Tarzan sem Chita. Impossível”.
A CONMEBOL é a organização responsável pelas seleções e campeonatos realizados entre os países da América do Sul, como a Copa Libertadores, Copa Sudamericana e as Eliminatórias da Copa do Mundo. Isso significa que, de tantas opções de duplas inseparáveis, Domínguez ter escolhido a Chita, uma personagem macaca, para referenciar o Brasil em sua fala só deixa claro a atitude racista cometida pelo argentino.
Além das notas de repúdio
Após a repercussão da entrevista com Alejandro Domínguez, a deputada federal Erika Hilton enviou uma nota à Justiça para que o presidente da CONMEBOL responda por racismo. Além de ressaltar que “racismo é crime, fora e dentro dos estádios”, a deputada oficiou o Ministério das Relações Exteriores para declará-lo persona non grata no Brasil.
Ações como essa são importantes para que os responsáveis pelo crime e outros envolvidos tenham consciência dos seus atos e sofram as devidas consequências. No estado do Rio de Janeiro, por exemplo, foi colocada em ação a Lei Vini Jr., que permite a paralisação da partida por um tempo indeterminado pelo juiz, ao presenciar ou ser notificado sobre uma atitude racista dentro do estádio.
Em Dezembro de 2024, em São Paulo, logo após a paralisação de 30 minutos de uma partida entre Grêmio e River Plate pelo torneio de futebol feminino Ladies Cup, seis jogadoras do time argentino foram expulsas após cometer atos racistas contra as jogadoras do time tricolor gaúcho. Quatro das seis jogadoras foram presas após o jogo.
Paralisar a partida, proibir a torcida de assistir à partida no estádio, multar o clube ou jogadores pelo crime cometido são atitudes que estão se mostrando cada vez mais insuficientes para combater esse tipo de crime. É importante que os principais órgãos do futebol emitam notas de repúdios sobre os acontecimentos, mas é preciso ainda mais que eles tomem atitudes mais severas, como a eliminação direta ou expulsão do clube da competição, para que fique claro que o racismo não tem vez – não apenas no mundo futebolístico, mas em qualquer lugar.